sábado, 29 de maio de 2010

intervalo

'a arte era complicada, ela precisava de talento e investimentos. a arte era uma busca perdida. ela implicava sofrimento, raiva, ódio. ela implicava artistas, essa raça maldita. no século passado, os artistas quebravam tudo nos quartos de hotel e se suicidavam por razões obscuras. no século anterior, eles se automutilavam. eles estavam sempre metendo o bedelho no negócio dos outros, a política, por exemplo. eles tomavam drogas. os artistas eram uns criadores de caso. a gente não podia fazer nada a respeito: era o que fazia deles artistas que fazia que fossem criadores de caso.

a gente tinha de aguentá-los, tolerá-los, elogiá-los, consolá-los e lidar com eles, eles eram o tempo todo 'incertos', depois de três resultados infelizes, eles não conseguiam fazer mais nada, as mulheres deles se mandavam, a gente tinha de ir atrás delas etc. e, se pelo menos eles mostrassem realmente quanto valem, se uma vez lançados, lançados para sempre, uma vez lucrativos, lucrativos para sempre? mas os artistas não se satisfaziam somente em ser criadores de caso, eles também eram irregulares. o gênio às vezes se esgota, e, uma vez esgotado, o público o renega. o público renega, não entende por que, reclama, manifesta sua decepção boicotando os discos, e acaba indo procurar em outro lugar.

a gente não habitua impunemente o público com qualidade. quando a qualidade decai: o público se manda. e o gênio incompreendido se vinga no mobiliário da sua suíte, e isto custa caro, e não adianta nada. e ainda é preciso que ele tenha gênio. eles não andam dando sopa na rua, os gênios, sobretudo ultimamente.

e o gênio, ou digamos o talento, nunca teve o mérito de agradar todo mundo, ele rima com crítica, controvérsia, até rejeição. a arte é subjetiva, a merda, universal.'

(lolita pille 'bubble gum' editora intrinseca)

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